sábado, 20 de agosto de 2011

The Devil's Daughter

In the Middle Ages charging interest, which was then called usury, was forbidden by the Church laws. The practice of usury was deemed to be a sin.

This theme had reflexes in literature. In The Divine Comedy Dante, influenced by the theology of his time, places the usurers in the inner ring of the seventh circle of hell, in the company of blasphemers and sodomites. Shakespeare, in The Merchant of Venice, dramatically describes Shylock’s humiliation at the court in order to get redeemed from the practice of usury, before he could get his money back.

As to the legal aspect of the question, the lawyers drew a distinction based on the theory of lucrum cessans, a Latin name for ceasing profits, i.e. gains forgone in lending or advancing money, to circumvent the Church’s ban on interest. Such a distinction was recognized by theologians with some qualifications, limiting legitimate interest to cases where the lender shared the risk, such as in putting money in a joint venture, for example.

This issue recalls a tale by Manuel Bernardes, a Portuguese writer of the XVI/XVII centuries, that I paraphrase here to illustrate the history of interests:

The Devil had a daughter called Usury, to whom he looked for a husband. In spite of a gross dowry in coined money that she carried along with herself, no good man was willing  to marry her.
Then said the Devil with himself: “I know what I'm going to do.” No sooner said than done. He changed Usury’s name, calling her Lucrum Cessans, and candidates already come in rivalry disputing her hand (up to here after Bernardes).
Married Lucrum Cessans and Capital. The wedding party takes place. Celebrate the Devil and the Devil’s wife. Celebrate the devils as a whole. “Lucrum Cessans, Lucrum Cessans, hurray, long may she live!”, cheered the devils rejoicing, for they knew Latin and the Church laws quite well.
That night the Devil lay down happy on his bed of flames, figuring out how many men he would bring to hell with the marriage he so much cherished. Indeed, with the advantageous union Capital multiplies. Under the veneer of lucrum cessans, simple and compound interests are charged unabashedly.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Modelo de letra de câmbio

(De meu livro, Postilas de Direito Cambial, a ser publicado brevemente)


I - Modelo em branco

  1. A indicação do lugar (município) e da data da emissão (dia, mês e ano).
  2. A importância a pagar, em algarismos, e a indicação da moeda (ex.: R$, Eur, US$).
  3. A indicação do vencimento.
  4. A importância a pagar, por extenso, e a espécie de moeda.
  5. O nome do beneficiário, que pode ser o próprio sacador.
  6. O nome e endereço do sacado.
  7. O nome e endereço (ou carimbo) do sacador.
  8. A indicação do lugar (município) e endereço de pagamento; se indicado um estabelecimento bancário: o nome do banco, o endereço da agência e, se for o caso, o número da conta.
  9. A assinatura de próprio punho do sacador.
  10. Espaço reservado para a assinatura do aceitante. 

II - Modelo preenchido

domingo, 15 de maio de 2011

A filha do Diabo

O Diabo tinha uma filha, chamada Usura, para qual procurava casamento. Mas não havia homem de bem que a quisesse, sem embargo de trazer consigo mesma grosso cabedal em dinheiro amoedado. Disse então: "Já sei o que hei de fazer." Mudou-lhe o nome, e à Usura chamou Lucro Cessante. Já acorrem candidatos à porfia.

Esse conto de Manuel Bernardes (Nova Floresta, 1727, vol. V, título III), aqui parafraseado, ilustra o artifício empregado pelos mercadores medievais para contornar a probição da usura, como então se denominava o juro contratual, condenado pelo Direito Canônico.

Em meu livro Postilas de Direito Cambial, que será publicado brevemente, o apólogo tem a seguinte continuação, que não é de Bernardes: "Casaram Lucro Cessante e o Capital. Celebraram-se as bodas. Festejaram o Diabo e a mulher do Diabo. Festejou a diabada. Com o vantajoso casamento, multiplicou-se o Capital. Sob a capa de lucro cessante, juros simples e compostos passaram a ser cobrados despudoradamente."

sábado, 14 de maio de 2011

Título de crédito - Definição de VIVANTE

(De meu livro, Postilas de Direito Cambial, a ser publicado brevemente)

 “Nenhum vento ajuda o navegador que não sabe a que porto se dirige”:
 Ignoranti quem portum petat nullus suus ventus est (SÊNECA, Epistulae Morales).

O aforismo de SÊNECA vem a propósito da importância da definição para a Ciência. Sem uma definição, fica-se como o navegador que não sabe a que porto veleja.

Segundo a conhecida definição de CESARE VIVANTE, título de crédito é o “documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele mencionado.”

              VIVANTE (Trattato di Diritto Commerciale, 1929, vol. III, n. 953).

Explica VIVANTE:

“Diz-se literal o direito mencionado no título, porque existe segundo o teor do documento; autônomo, porque o possuidor de boa-fé exerce direito próprio, que não pode ser restringido ou elidido pelas relações havidas entre os possuidores anteriores e o devedor. Diz-se que o título é o documento necessário ao exercício do direito, porque, enquanto existente o título, não pode o credor, sem exibi-lo, exercer nenhum direito, principal ou acessório, que ele porte consigo, e não se pode fazer modificação alguma no teor do título, sem neste anotá-la.”

            Ibidem (tradução não-literal).

A definição vivantiana (acolhida quase ipsis litteris no Código Civil brasileiro de 2002 ─ CCiv, art. 887) pode dizer-se, por sua fecundidade, germinal.

Sua vantagem é a simplicidade. A simplicidade, disse OCKHAM, filósofo inglês (séculos XIII/XIV), nem sempre é a perfeição, mas a perfeição é quase sempre simples.

Assim como ocorre com grande parte das definições da Ciência do Direito, e, aliás, de outros ramos do saber, trata-se de uma definição aproximada, mas nisto está a sua virtude, não seu defeito. A definição possui um valor simbólico, mnemônico; para ser comunicativa, deve ser breve.

Entre nós o Professor NEWTON DE LUCCA, após manifestar sua preferência pela fórmula de VIVANTE, por seu caráter sintético, aponta algumas definições alternativas à do grande comercialista italiano, nas quais se salientam aspectos acidentais ou secundários, por isso mesmo não-essenciais ao definido, com o sacrifício da concisão.

              DE LUCCA (Aspectos da Teoria Geral dos Títulos de Crédito, 1979, p. 17 e ss).

Não obstante, certos autores contribuíram positivamente para iluminar, com sua crítica, algum ponto menos claro da definição vivantiana ou para completá-la. Não cometeremos o vilipêndio, assim como não é esta certamente a intenção do Professor DE LUCCA, de atribuir-lhes a “glória do caranguejo”, que só figura no Zodíaco porque mordeu o calcanhar de Hércules.

                JOÃO MANGABEIRA (Ruy. O Estadista da República, 1960, p. 11).

sábado, 30 de abril de 2011

Origem e evolução da letra de câmbio

Excerto de meu livro Postilas de Direito Cambial, a ser brevemente publicado. Abreviações: LC = letra de câmbio; NP = nota promissória.

1. Os três períodos. Costuma-se distinguir três períodos na história da LC: o italiano, o francês e o alemão. O primeiro vai da Idade Média ao século XVII; o segundo, dessa época até meados do século XIX; e o último, de 1848 até nossos dias.

2. Período italiano. Caracteriza-se este período pelo nascimento da LC, então sob a forma de carta (< Lat. littera = letra, carta, epístola), pela qual o remetente (sacador), com base em depósito monetário recebido, incumbia seu correspondente (sacado), noutra praça, de pagar, à pessoa designada (beneficiário), o equivalente em outra moeda.

Era então a letra instrumento do contrato de câmbio (< Lat. cambium = câmbio, troca, permuta); daí o nome letra de câmbio. A distantia loci justificava um ágio sobre o preço do câmbio, em face do risco representado pelo transporte da moeda, numa época em que as viagens, por terra ou por mar, eram inseguras.

Os mercadores florentinos, venezianos, genoveses, mais inclinados a cartagineses do que a romanos, praticavam a operação à larga, naturalmente com ágio.

A título de lucro cessante, contornava-se a proibição da usura, como então se denominava a estipulação do juro contratual, condenado pelo Direito Canônico, o que traz à lembrança o seguinte apólogo, narrado por MANUEL BERNARDES, que aqui parafraseamos, com o intuito de amenizar a aridez do tema.

O Diabo tinha uma filha, chamada Usura, para a qual procurava casamento. Mas não havia homem de bem que a quisesse, sem embargo de trazer consigo mesma grosso cabedal em dinheiro amoedado. Disse então: “Já sei o que hei de fazer.” Mudou-lhe o nome, e à Usura chamou Lucro Cessante. Já acorrem pretendentes à porfia (até aqui, conforme BERNARDES).

BERNARDES (Nova Floresta, 1727, vol. V, Título III, p. 375).

Casaram Lucro Cessante e o Capital. Celebraram-se as bodas. Festejaram o Diabo e a mulher do Diabo. Festejou a diabada. Com o vantajoso casamento, multiplicou-se o Capital. Sob a capa de lucro cessante, juros simples e compostos passaram a ser cobrados despudoradamente.

Ainda no período italiano, paulatinamente se vai acrescentando à letra o endosso, o aceite e o aval. Com o aval, o aceite e o endosso, a letra ganha maior liquidez e mobilidade.

Pelo endosso, o beneficiário transfere a cambial a terceiro, assinando-a no verso (< Lat. in dorso = no dorso). Obtendo o aceite do destinatário (sacado), assegura-se o sacador ou o beneficiário de estar aquele disposto a pagar, podendo então mais facilmente negociar o título. E, com o aval, aumentam as garantias de pagamento da letra.

Enquanto a LC prosperava, sua prima pobre, a NP, vegetava. Sendo o juro proibido pelo Direito Canônico, por ser considerado um rendimento “ocioso”, poucos estariam dispostos a emprestar dinheiro de graça. O mútuo usurário, como então se chamava o mútuo frugífero, era confinado ao mercado negro, operado pelos argentários.

Com a Reforma, cai ou simplesmente se ignora o veto religioso ao juro contratual, uma das molas do nascente capitalismo, em especial nos Estados protestantes. Com a laicização do juro, cai também a lei do justo preço, estabelecida no Direito Canônico, a par da interdição da usura, como limites morais ao consenso.

Já florescem as companhias, já proliferam as ações, as debêntures, as notas promissórias. Longe de condenar a busca do lucro e a acumulação de riqueza, consideradas mesmo por LUTERO como “obra do demônio”, os calvinistas veem na prosperidade terrena o “sinal da salvação”.

3. Período francês. A Ordenança de Comércio de Luís XIV, o Código de Colbert (1673), reconhece expressamente a função translativa e a função de garantia do endosso, admitindo o reendosso, como registra ALBERTO ASQUINI.

ASQUINI (Titoli di Credito, 1966, n. 68).

Pela primeira função, o endosso transfere a propriedade do título; pela segunda, garante aos portadores subsequentes o pagamento da letra, caso o sacado não honre a letra no vencimento, podendo então o portador voltar-se contra os endossantes anteriores e o sacador (direito de regresso).

A letra deixa de ser apenas um instrumento do contrato de câmbio. A causa de sua emissão pode ser o fornecimento de mercadorias ao sacado, em vez de dinheiro. É expressamente consagrada a regra da inoponibilidade das exceções e, com ela, a autonomia do direito adquirido com o título, como assinala JOÃO EUNÁPIO BORGES.

EUNÁPIO BORGES (Títulos de Crédito, 1971, p. 41).

Entretanto, era o sacador obrigado a ter provisão em poder do sacado, à semelhança do cheque, decorrente de mercadoria vendida, dinheiro emprestado ou outra fonte, assim como a declarar, na letra, o valor recebido, do beneficiário ou tomador, em consideração do qual o sacador lhe entregava o título.

O Code de Commerce de 1807 manteve tais exigências. Visava o sistema francês a proteger o sacado contra o saque de letra “sem lastro”, que, embora não lhe acarretasse nenhuma obrigação cambial, poderia comprometer-lhe o crédito perante terceiros que confiaram na declaração do sacador.

Ainda hoje, no Direito francês, o sacador é obrigado a possuir provisão (crédito) junto ao sacado, ao tempo do vencimento, abolida, no entanto, a cláusula obrigatória de valor recebido.

4. Período alemão. Na Alemanha, a LC dissocia-se de sua causa inicial, tornando-se, em mãos de terceiro, título de direito abstrato, bastante por si mesmo, como também se liberta das amarras representadas pela provisão e pelo valor recebido, do Direito francês. A LCambial alemã de 1848 sanciona esses princípios.

Numa síntese feliz, resume JOSÉ MARIA WHITAKER o caminho percorrido pela LC, desde suas origens até a Idade Contemporânea:

“No primeiro período, a letra operava a circulação do dinheiro; no segundo, a circulação de valores; no terceiro, passou a constituir por si mesma um valor.”

WHITAKER (Letra de Câmbio, 1963, n. 5).

terça-feira, 26 de abril de 2011

Denotação e conotação

Em Linguística e Semiologia, denotação refere-se àquilo que a palavra ou símbolo designa objetivamente; e conotação, àquilo que o símbolo ou palavra significa subjetivamente.

Considere-se o seguinte exemplo de Gottlob Frege, filósofo e matemático alemão (1848-1925), fundador da Lógica Matemática, e, ao lado de Aristóteles, considerado um dos maiores lógicos de todos os tempos. No ensaio Über Sinn und Bedeutung, publicado em 1892, que pode ser traduzido por "Sentido e Significado", ou "Denotação e Conotação", Frege ilustra a variação semântica com esta analogia:

"Estrela Vespertina e Estrela Dalva têm o mesmo significado, mas sentidos diferentes."

Dito em outras palavras, os dois nomes do planeta Vênus designam a mesma realidade objetiva, mas conotam diverso valor semântico. Uma diferença e tanto, que o digam os poetas e sonhadores.